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Brazil - Cablegate: os relatórios sobre o MST

Natalia Viana, 19 de dezembro de 2010, 14.00 GMT

O Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) mereceu especial atenção da embaixada americana em Brasília e dos consulados – que, é claro, não viam o movimento com bons olhos.

São 7 relatórios enviados entre 2004 e 2009 avaliando como funciona o movimento e o seu peso político. Um deles, de outubro de 2005, mostra como os EUA se empenharam em investigar a ocupação de uma fazenda pertencente a um grupo americano, em Minas Gerais.

“(O gerente da fazenda) Genevil depois disse ao adido para temas agrícolas da embaixada que o juiz que queria negociar com o MST foi substituído por um outro ‘novo, mais sensato’. Genevil pareceu muito contente com essa decisão e acreditava que a ordem de reintegração seria expedida”, descreve o telegrama.

Outros telegramas avaliam que o MST tem sido “marginalizado como força política” por causa da avanço econômico e do programa Bolsa-Família.

O cônsul-geral em São Paulo, Thomas White, também não poupou críticas ao MST, ao ouvir que lotes distribuídos para fins de reforma agrária acabam sendo alugados para fazendeiros.

“O presidente Lula tem sido flagrantemente silencioso com suas promessas de campanha de apoiar o MST por uma boa razão: uma organização que ganha terra em nome dos sem-terra e que depois a aluga para as mesmas pessoas de quem tirou tem um sério problema de credibilidade”, escreveu em 29 de maio do ano passado.

Abril vermelho

A onda de ocupações do Abril vermelho de 2004 parece ter tomado de surpresa a embaixada americana. Logo a então embaixadora Donna Hrinak foi encarregada de escrever um relatório sobre o MST explicando do que se tratava. O documento foi enviado a Washignton em 12 de abril.

Hrinak criticou o líder João Pedro Stédile, que disse ter uma retórica “picante”, e fazer comentários como “Abril será um mês vermelho”.

Mas o documento avalia que o Plano Nacional de reforma Agrária – que previa de assentar 400 mil famílias até o fim de 2006 - andava mesmo a passos lentos: “O Plano Nacional é bom no papel mas está longe de ser realizado”.

Como resultado do abril vermelho, diz Donna Hrinak, “alguma verba deve ser liberada para reforma agrária, mas não o suficiente para alcançar as metas do Plano Nacional. De outro lado, o MST não vai dar trégua nas suas invasões de terra – nunca dá – mesmo se o governo atender suas demandas”.

Terra americana

Em outubro de 2005, a representação americana, que já acompanhava o MST, engajou-se ainda mais em investigar o movimento depois da ocupação de um terreno de propriedade do gupo americano Farm Management Company, baseado em Salt Lake City, Utah.

Cerca de 300 sem-terra ocuparam a fazenda em Minas Gerais para pedir a aceleração da reforma agrária.

O adido agrícola da embaixada foi enviado ao local para averiguar a situação. Procurou o gerente da fazenda, Macedo Genervil, que relatou como a polícia estava agindo para proteger a propriedade:

“De acordo com Genevil, policiais militares confinaram o MST à sede da fazenda, e o equipamento agrícola não foi danificado”, escreveu a Washington o embaixador John Danilovitch.

O gerente disse também que o governo mineiro tinha concordado em mandar policiais para a desocupação e estava apenas esperando a ordem de reintegração de posse. Eles ficariam na fazenda até a conclusão da negociação entre o juiz e o MST.

Mas, segundo Genevil, o juiz que queria negociar com o MST havia sido substituído por outro juiz “novo e mais razoável”.

“Genevil pareceu muito contente com essa decisão e acreditava que a ordem de reintegração seria expedida durante a semana de 10 de outubro”.

Para concluir, o embaixador John Danilovitch descreve ainda que a fazenda Agroreservas costuma ser usada como ponto de visitação pelo Serviço Agrícola no Exterior do governo americano, levando visitantes da Associação Nacional de Fazendeiros e do Escritório de Fazendas Americano para mostrar a escala das operações no Brasil.

“Essa invasão marca a primeira vez que o MST ocupou uma fazenda americana, e apesar de causar peocupação, não acreditamos que a invasão tenha sido motivada pela ligação da fazenda com os Estados Unidos”.

Consulado dos EUA acusa MST de “alienar os locais”

Um dos documentos mais críticos ao MST foi enviado ao Departamento do Estado americano em 29 de maio de 2009 pelo ex-cônsul em São Paulo, Thomas White. O título: “O método MST: Trabalhar com o Estado, alienar os locais”.

Segundo o documento, o consulado procurou um pesquisador do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos em Reforma Agrária da Universidade do Oeste Paulista em Presidente Prudente, Clifford Welch, que teria explicado que “o MST segue uma metodologia pré-planejada nas ocupações de terra que inclui contatos com o INCRA para ajudar a selecionar alvos”.

Segundo Welch, depois de negociar a posse da terra e distríbuí-la aos assentados, seria a hora de lucrar. “Em uma prática cínica e irônica, os membros do MST algumas vezes terminam locando para o agribusinesses a mesma terra que eles conseguiram”, descreve o telegrama.

Welch também teria afirmado que o MST tem informantes dentro do INCRA.

“Welch disse ao representante econômico da embaixada que o INCRA não publica as informações que detém e a única maneira do MST poder ter acesso seria através de informantes dentro do INCRA”. A seguir, o cônsul observa que houve pelo menos um caso em que um ex-funcionário do INCRA ingressou no MST.

Welch, que é visto como uma pesquisador “pró-MST” teria ainda aformado que na verdade as famílias sem-terra não são fromadas de 5 pessoas, como diz o movimento, mas de três. “Isso significa que o número de integrantes do MST, estimado em 1.5 milhões de pessoas, na verdade está superestimado em 40%”, avalia o documento.

A crítica dos “locais”

O representante da embaixada também procurou “locais” como o prefeito e o presidente da FIESP de Presidente Prudente, que disseram que as ocupações derrubaram o preço da terra em um terço.

“Conversas com cidadãos de Presidente Prudente no interior de São paulo indicaram que poucas pessoas na comunidade apóiam o MST”, diz o documento. “Locais que não são do MST prefereriam que eles saíssem, pois temem que as táticas do movimento vão afastar investimentos estrangeiros no local”.

A conclusão do ex-cônsul é taxativa. “A prática do MST de distribuir lotes de terra fértil a seus fiéis e de alugar a terra de novo ao agronegócio é irônica, para dizer o mínimo. O presidente Lula tem sido flagrantemente silencioso com suas promessas de campanha de apoiar o MST por uma boa razão: uma organização que ganha terra em nome dos sem-terra e que depois a aluga para as mesmas pessoas de quem tirou tem um sério problema de credibilidade”, finaliza o telegrama.